Olá a todos. Sejam bem-vindos a esta [vida criativa].
É mais fácil fazer algo quando não há referências? Quando, qualquer coisa que se faça é novidade, e pode fazer a diferença no status quo existente?
Ou é mais fácil fazer algo quando temos mestres, e tradições, que podemos (devemos) aprender, e em que nos apoiar, para darmos o passo em frente?
Acho que só depende da pessoa que está à procura do que irá fazer… do criador construtivo (como os subscritores deste blog).
Pode encontrar esse trabalho? Essa diferença? Sim. Ou, pode não o encontrar. Passar a vida à procura e nunca reconhecer aquilo que teria feito a diferença e feito a arte avançar.
Escrever, e considerar o que escrever, ou a aproximação a esta actividade (ia chamar-lhe profissão…) pode ser um exemplo destas duas formas.
Por um lado, podemos passar a vida à procura do que escrever e como. Podemos passar a vida à procura do sucesso comercial, ou do lugar no pódio dos grandes (da literatura)… e, nunca ter o que é preciso para lá chegar.
Por outro lado, podemos definir um objectivo e atingi-lo com alguma facilidade. Por exemplo, definir uma quantidade, definir uma meta, abandonar qualquer esperança de fama e fortuna, e ser apenas um passo, uma vivência de uma realidade que é como qualquer outra.
Como quem vai para o escritório e passa o dia a responder a e-mails. A cadência daquilo que se faz é o que se faz. É o que somos. É quem somos.
Assim, quando o objectivo é encontrar algo de relevante, algo com sentido nesta nossa existência normal, a verdade é que qualquer coisa que façamos é, em si, uma acção e uma finalidade.
Escrevemos e temos o que escrevemos. E, aquilo que escrevemos é o produto final que desejámos obter.
Mas, e a qualidade? E as bases do que se considera ser um avanço, um acrescento ao que já existe, uma novidade, ou um simples reorganizar de uma forma mais inteligível e pessoal.
É o objectivo escrever melhor? Mais fluído? Mais bonito? Moderno ou clássico? Novo ou qualquer outra característica? É mais fácil aceder aos cânones? Perseguir as instituições formais? Viver como todos os outros, e justificar a necessidade com a Necessidade de Sobreviver?
Conseguimos sequer distinguir entre as duas realidades? As escolhas que fazemos que nos trazem aí?
Não sei. Mas tenho procurado respostas a algumas destas perguntas. Em, especial quando me cruzo com as histórias de certas vivências artísticas.
Marianne North
Em modo: pesquisa sobre Marianne North (1830–1890). Inglesa, numa época em que as mulheres não podiam frequentar instituições de ensino e para pouco mais serviam do que casar e procriar, Marianne apaixonou-se pelas plantas e pelo mundo natural.
A sua vida passou-a a percorrer o mundo, na companhia de seu pai, que tudo fez para a ajudar nas suas batalhas. Visitou vários países e pintou, ensinando-se a si própria a fazê-lo, assim como os conhecimentos de botânica que reuniu.
As suas pinturas imortalizaram milhares de plantas. Muitas que nunca haviam sido vistas, e que muitos nunca chegariam a ver com os seus próprios olhos, até às desconhecidas dos próprios botânicos.
Descobrir algo novo, quando a maioria do planeta era uma novidade, não parece motivo para estranheza. Mas é. A coragem de explorar o mundo, de capturá-lo por artes que nos são proibidas de conhecer por outros, a necessidade e engenho de partilhar o que se captura, Marianne viveu isso tudo e mais.
Numa época em que, não existindo fotografia botânica, os espécimes eram capturados em aguarela perdendo as suas cores, Marianne usou tinta a óleo e capturou as plantas nos seus ecossistemas. Índia, Egipto, África do Sul, Jamaica, Japão, Brasil, Indonésia.
No seu regresso a Inglaterra, a doação da sua obra permitiu o avanço na ciência e um lugar permanente nos exploradores botânicos da época.
A falta de meios permanece como indispensável à descoberta? É mais fácil assim?
No Baú de Curiosidades de Marianne:
Várias espécies de plantas exóticas têm o seu nome.
A sua obra, permanece em exposição permanente, a única por uma mulher em solo da Grã-Bretanha, nos Jardins de Kew.
Encontramos as suas memórias, publicadas postumamente, em domínio público em Recollections of a Happy Life.
Pierre-Auguste Renoir
Em modo: pesquisa sobre Pierre-Auguste Renoir, (1841-1919). Pintor francês, pilar do nascimento do Impressionismo, com uma fixação em estudar, e desempenhar para a academia tradicional e, em simultâneo, um dos criadores do movimento Impressionista na pintura (movimento escarnecido pelos mestres tradicionais à época).
Renoir executou as suas obras, com variados pontos de vista pessoais, que podem fazer a diferença quando procuramos o nosso caminho e as nossas respostas. Reconheci algumas das suas práticas em justaposição com outras relevantes.
Por exemplo, dizem os historiadores de arte que ele pintava versões da vida, não como ela era, mas como ficção.
Renoir mostra-nos a ilusão de uma boa vida nos seus quadros. Mostra-nos cenas de vivências abastadas, e de pessoas em pleno divertimento, utilizando modelos para o fazer… numa época em que Paris se encontrava destruída pela mudança de sistema político, e pela guerra civil que se sucedeu.
A ficção serviu-o bem na sua busca pelo quadro que desejava pintar.
Na vida dita normal, Renoir foi o artista em dificuldades financeiras, e acompanhou outros em, maior ou menor, estados de necessidade.
Viveu a submissão aos que definiam os cânones da época e, em simultâneo, foi em busca do novo, como uma nova teorização do uso da cor e do traço impressionista.
E, quando muitos outros formavam os círculos boémios de Montmartre, Renoir nunca deixou de pintar e segundo ele, o trabalho do artista é criar (aqui acrescento: do pintor é pintar, e do escritor é escrever), não é teorizar sobre o que é a arte, de formas que o impeçam de praticá-la.
Frequentar os locais de entretenimento da época deram-lhe os motivos dos seus quadros, com as suas ilusões nas personagens que usava, mas não lhe retiraram a necessidade de manter uma vida dedicada à sua arte.
Nos bares, enquanto os outros falavam sobre arte, e bebiam até de madrugada, incapacitando-os de pintar na manhã seguinte, Renoir manteve-se fiel aos seus horários e à sua arte.
Perseguir o tradicional para obter sucesso foi outra das ideias que sempre o acompanharam.
À parte os momentos de dúvida que o assaltaram, durante a sua vida, a verdade é que Renoir procurou sempre executar as obras que podiam ser aceites nas exibições da academia (mais tradicionais), enquanto em simultâneo executava os seus estudos no estilo que gostava de explorar (Impressionismo). E, mais tarde, os retratos e os trabalhos por encomenda foram parte integrante da sua sobrevivência.
Saber como se faz, as regras, o conhecimento tradicional, para se poder aprender a fazer e a inovar, se possível. Usar o tradicional, que o inspira e, em simultâneo, procurar a inovação foi uma estratégia que, na época, o serviu bem.
Sobre Renoir, a execução artística e a inovação
Os três aspectos da inovação do Impressionismo: o toque das pinceladas é rápido e incompleto; os assuntos modernos como objecto da arte; a liberdade e a subjectividade do artista que está a criar algo.
o toque das pinceladas é rápido e incompleto
A execução, que se queria arreigada nos clássicos pintada como se fosse uma fotografia, uma captura exacta do que se vê. Ele sabe fazê-lo e, no entanto, incentiva-se a fazer diferente, em que as suas figuras desvanecem-se no quadro, enquanto capturam o sentido do que é através da luz e do movimento das suas pinceladas.
os assuntos modernos como objecto da arte
A modernidade das cenas que captura, mesmo se usando os sumptuosos elementos das classes altas, trazendo-as para cenas que poderíamos acreditar serem excertos da vida diária em momentos de lazer. O que vemos nos seus quadros é uma realidade ficcional. Os cenários existem, mas as pessoas são modelos, e as cenas são ficção.
a liberdade e a subjectividade do artista que está a criar algo
Inspirar-se no passado, aprender, mesmo que a realidade esteja em constante e violenta mudança. Esta é a liberdade artística a que almejou (e à qual almejamos?!?). Termos liberdade para criar e respeitarmos a subjectividade inerente à obra que criamos. Não havendo uma só resposta para o que é considerado qualidade, mas liberdade e subjectividade suficientes, para usarmos o que temos ao criarmos a nossa obra (escrita).
No Baú de Curiosidades de Renoir:
Num período tardio da sua vida, e quando ficou incapacitado com artrite, custando-lhe o uso das suas mãos, Renoir amarrava o pincel ao braço para poder continuar a pintar. Continuou até ao momento da sua morte.
Com conhecimento firmado antes de nós, ou a possibilidade de desvendar novas descobertas e redesenhar os limites, perseguir uma actividade (há quem chame vocação?) requer coragem, empenho, trabalho. Requer matutar e maquinar…
… o resultado? Logo se verá.
Volto a partilhar a citação:
Seu texto merece ser lido e relido, enquanto, por aqui, cada trecho se transforma em uma reflexão a ser digerida e expandida. E isso me faz perceber que a arte (e a escrita) não são caminhos solitários se temos com quem compartilhar e em quem nos inspirar. Obrigada por tanto!
Olá, Monique.
Obrigada pelas suas palavras. Fico feliz que tenha gostado e por encontrar com quem compartilhar o que escrevo.
Obrigada,
Até Breve!
Sara
Olá, Sara
Mais de que as palavras sobre Mariane ou Renoir, como ilustração da procura do caminho que nos faz sentido (independentemente do outcome dessa procura, seja a fama ou o reconhecimento, ou o seu oposto), o que me captou a atenção foi “escrevemos o que temos de escrever”.
Há quem o faça tendo como objetivo atingir o tal lugar no pódio, onde importa chegar a muitos, agradando a quase todos para que, por essa escrita se faça fama, se ganhe reconhecimento, se faça disso uma profissão.
E depois há os outros. Os que escrevem, só porque sim. Como forma de libertarem o que lhes vai na alma, seja a mais escura das noites ou um belo dia de verão. Alguns, até conseguem ser famosos quando a sua escrita, os outros atinge. Que bom!
Requerem, estes pressupostos de escrita, direções opostas.
Escrevo de fora para dentro ou de dentro para fora?
Obrigada pelo insight sobre duas importantes figuras que se destacaram por “make the attempt of the life I want”.
Olá, Ana.
Obrigada pelas tuas ideias sobre o assunto. É bom ver como os outros interpretam.
Obrigada,
Até Breve!
Sara