Opinião “The Handmaid’s Tale” por Margaret Atwood

the handmaid's tale

Olá a todos. Sejam bem-vindos [à minha Biblioteca].

Adiciono “The Handmaid’s Tale” de Margaret Atwood à minha biblioteca (de conhecimento) e não spoilarei o leitor. Um dia conseguirei fazer um artigo de opinião “normal” sobre um livro. Ainda não é hoje.

Tenho medo de escrever este texto. Porquê?

the handmaid's tale

Porque “The Handmaid’s Tale” de Margaret Atwood é feito de medo e, neste mundo, a melhor forma de nos tornarmos um alvo é mostrarmos que, aquilo que pensamos, não se alinha com o que a maioria pensa.

Mas, o medo não se prende com aquilo que é dito neste texto. Estes temas não podem ser desconhecidos da maioria das pessoas e, muito menos, do sexo feminino, pelo que medo é algo com o qual convivemos, e em que os nossos estados de alerta acontecem na metamorfose dos cuidados necessários a cada ocasião.

Vá! Quem evita proximidades esquisitas, e não permanecer em locais perigosos, quando sozinha?

Não há medo do que é dito. Não é nada de novo para muitos de nós.

Outra perspectiva sobre este medo… convido-vos a espreitar uma qualquer entrevista a Margaret Atwood, que se encontram a passear no YouTube. Em todas elas, ou em todas as que vi, reconhece-se o treino que Atwood tem em desviar-se daquilo que, uma palavra fora da ordem, pode transformar em algo perigoso para a autora. Em especial, nas entrevistas mais próximas dos lançamentos dos seus livros.

Compreendo a necessidade. Ao longo das décadas, não devem ter faltado trolls em busca de provocar ofensa e distribuir medo e dor.

É interessante analisar o mecanismo de defesa, e aprender com ele… mais uma vez, sou mulher e, como tal, não me têm faltado trolls disfarçados de reaccionários por aí. Cheguei a inventar uma receita de Túbaros de Troll Estufados (que podem ler aqui…), em homenagem à cozinha fantástica… e de época.

Hey! Eu continuo por cá, a escrever. Não porque me fica bem, mas porque gosto. Algo que foi afirmado (nas minhas costas e nas redes sociais) que nunca aconteceria.

série the handmaid's tale

Um pormenor, que me surpreendeu em “The Handmaid’s Tale” , e que posso dizer que é um sinal da importância deste texto: o audiobook não me permitia fazer mais nada. A minha atenção era dele e de nada mais.

E, para quem ouve audiobooks com frequência sabe que, por vezes, este formato permite-nos acumular actividades. Com “The Handmaid’s Tale” isto é difícil.

Publicado em 1985, compreendo o efeito que esta história teve no mundo, e como se manteve na biblioteca da humanidade. Lido hoje, acho que certas maldades perdem o impacto.

Primeiro, porque somos expostos a tanta informação que acabamos insensíveis às repetições de certas atrocidades. Depois, porque já muito se copiou, e exagerou, ao construirem outras histórias ficcionais, por vezes, exageram de propósito na busca do próximo acto traumatizante (ocorre-me ‘Game of Thrones’ em toda a sua exposição gráfica da execução da maldade humana).

No entanto, são inegáveis as 5 estrelas de classificação… e, tenciono adicionar a cópia física à minha biblioteca. E, reler. E, recomendar. E, manter esta história comigo.

Ahhh, mas a forma de exposição desta história, a voz desta personagem principal, o encadear de acontecimentos, a necessidade de incentivar o leitor a ler, sem o obrigar a formar opiniões sobre os assuntos… até, no final, somos confiados com a tarefa de acreditar no que desejamos. O leitor deste livro, o verdadeiro apreciador, é um leitor interessado, aquele que confia na ficção como a melhor demonstração de realidades.

Ocorre-me que, este livro ensina-nos a pensar sem paternalismos. As realidades que vivemos confundem-se com aspectos desta história. As histórias que aprendemos em História (escolar) voltam para nos assombrar. A sensação que precisamos mesmo ter esperança para que não seja durante a nossa vida, e a das nossas filhas, que certos acontecimentos se materializem de formas similares. E, o quanto do que existe é assim, tal e qual como foi ficcionado.

Gostaria de dizer que, nesta história, temos uma heroína. Alguém que vai em busca da sua verdade, que não desiste perante as adversidades, e que encontra a sua coragem a cada reviravolta da história.

Gostaria e, no entanto… não posso fazê-lo.

O que temos é uma mulher que poderia ser uma qualquer de nós. E, por mais que ela se cruze com outras mulheres, em circunstâncias diferentes ou semelhantes às dela, a verdade é que, para todas elas a vida é feita da coragem de sobreviverem o dia-a-dia, tal como ele é… também não andamos por aí a gritar, e a espernear, cada vez que alguém acha que nos pode tocar, ou forçar a aceitar algo, sem a nossa autorização, certo? Ou a exigir reconhecimento, como pessoa que existe, quando é ignorada após um único olhar de um qualquer interlocutor.

Reconhecemos a coragem diária. E, noutras mulheres desta história, reconhecemos as outras perspectivas que as manietam para a sua realidade… até, aquelas que preferem a oposição aos seus semelhantes, à aceitação da posição de inferioridade na maioria dos assuntos e circunstâncias sociais.

Cada uma delas sobrevive como sabe, mesmo que seja na aceitação do seu papel secundário, e punitivo do seu semelhante… qualquer semelhança com a realidade, não é uma coincidência.

series opinion
um artigo sobre a série inspirada neste livro…

Nesta história, assim como neste mundo, as contradições amontoam-se. Acompanham-nos as tentativas de separar e racionalizar, de abafar sentimentos e, ao longo de toda a história, de negar que há uma parte humana que precisa da emocionalidade, e da proximidade física, para sobreviver saudável. A lealdade é fruto raro, assim como os bebés saudáveis.

Os motivos desta realidade ficcional são fáceis de imaginar: a destruição do nosso planeta, da nossa integridade física e do nosso modo de vida.

Já vivemos uma peste (Covid-19), duas guerras mundiais (ainda com sobreviventes vivos da 2ª), infindáveis conflitos espalhados por este mundo em que coabitamos, genocídios, países cuja religião domina os seus cidadãos e que oprimem as mulheres de forma brutal e pública, de teocracias abertas e aceites pelos outros países, de desastres nucleares e de possibilidades de novos desastres, migrações em massa e destruição de ecossistemas inteiros, da alteração da face do nosso planeta e, mesmo, a constante ameaça de exterminação da raça humana, se não nos controlamos nos nossos impulsos consumistas e irreais, ao invés de olharmos para o que aí vem de forma crítica.

Olá, desastres naturais, provocados pela alteração brutal das condições físicas do nosso planeta e de tudo o que nele habita.

E, pela primeira vez na História, temos acesso a informação para lá da distância que as nossas pernas nos carregam.

E, temos outras ameaças a insurgirem-se de formas mais, ou menos, sub-reptícias e a mostrarem-nos o quanto teremos de aceitar, se não educamos as pessoas neste mundo.

Diz que alguns homens estão em piores circunstâncias que as mulheres. E, concordo com isto. Carregam a imposição da liderança, são os primeiros a serem chamados para serem heróis. Tentam conciliar as exigências sociais com a pessoa que poderiam ter sido (objectores de consciência, em várias frentes desta vida). Sem esquecer a necessidade de sarar aquela parte mais agressiva, que uma infância menos compreensiva sempre traz.

E, não entrarei em questões mais sensíveis de género.

Neste livro, também os homens e as escolhas sexuais entram nesta balança.

Ou, o papel da religião organizada nos retrocessos sociais.

Cada Deus soa mais a um Adeus ao respeito do que a outra coisa qualquer… assim como o poder político. Não uma representação das pessoas, mas uma rábula existencial.

E, no entanto, acho que aprendemos a reconhecer a ficção pelo que ela é: racionalização e uma oportunidade de crescer. E, assim pergunto:

Qual é o limite da Liberdade humana? O que é o respeito? A lealdade? O que estamos dispostos a fazer? O que somos capazes de tolerar? O que é o amor? E o ódio? E, tantas outras perguntas, com que somos confrontados ao longo de “The Handmaid’s Tale” de Margaret Atwood. 5 estrelas. Para mim, são muitas mais.

Obrigada e Até Breve!

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