Quando falamos em alinhar as nossas paixões com as dos nossos leitores de que falamos nós? Quando falamos em fazer o trabalho pelo qual somos realmente apaixonados, falamos de quê? Quando falamos em descobrir o que dá sentido à nossa vida, a que nos referimos? Quando falamos nas nossas crenças, e em como somos de facto, o que sabemos nós?
Perguntas com respostas tão metafísicas que de pouco servem como respostas. Mas continuamos todos à procura da explicação inteligível. Eu sei que eu continuo…
Neste caminho de pouco me têm servido as minhas certezas. Com a excepção de restar-me a certeza que pouco sei sobre as minhas certezas.
E, em busca de respostas a estas, e outras, perguntas ocorreu-me (ao ver o último sucesso televisivo do momento no canal mais cor-de-rosa da nossa TV) que há coisas sobre nós próprios que não conseguimos ver. Acompanhem-me aqui, por favor…
Parece que o programa do momento em vários países, incluindo o nosso, é o Casados à Primeira Vista, ou algum nome similar… Fiquem comigo, que isto chega a algum lado, prometo.
O nome do programa muda de uns países para os outros e o formato também. A minha reacção imediata, e a primeira pergunta que me coloquei, foi: como podem regredir no tempo e aceitar algo inaceitável. Algo que demorámos tanto tempo a erradicar e que, em grande parte do mundo, ainda não acabou: o casamento arranjado.
Mas, não é a constatação que procuro evidenciar aqui. Cada um tem os seus motivos para fazer o que faz. Se eu concordo, ou não, é irrelevante.
Neste programa, a versão passa por especialistas, psicólogos e terapeutas (ao invés do tradicional pacote familiar) que arranjam o par ideal para alguns, poucos, escolhidos concorrentes. Abreviando… no fim, quando se faz a retrospecção final, a conclusão é sempre a mesma:
As pessoas não se conhecem a si próprias de todo.
Procuram coisas, situações e pessoas, mas não se perguntam porquê. Acham que querem uma coisa, que são de uma determinada forma, e fornecem essas informações aos especialistas, que prosseguem a decidir pares de coisas que não encaixam. Formam casais que não têm o que é preciso em comum. E, as pessoas seguem convencidas que querem algo que, realmente não podem saber o que é.
Primeiro, porque nunca o tiveram (nunca foram casadas) e porque, no fim, havia motivos pessoais para isso. E, ao passar por cima de toda aquela parte em que as pessoas se conhecem e interagem, passam por cima das subtilezas que mostram outras coisas, que são as bases de uma relação.
O que tem isto a ver com as nossas paixões pessoais? Pelas paixões pelas nossas artes, entenda-se. Tudo.
Como me comprometo com uma arte se não sei o que serei nela? Como escolho se não sei o que quero? Como escolho se não me conheço? Porque escolho fazer algo só porque acredito que sou de determinada forma?
É, tal e qual, como o Casados à Primeira Vista. Fazem uma lista do que são , de como são, do que querem para a vida. Apenas para, no fim, perceberem (ou percebermos) que nada daquilo que pensavam era real.
Claro que, na sua maioria, os participantes restam convictos da verdade inicial: quem (achavam que) eram e o que queriam para o futuro. A maioria dos divorciados permanece convicta que deseja casar, mesmo se confrontados com a dificuldade em aceitar o que um casamento traz, e do que é feito.
Como nas artes… Também desejamos ser coisas que, muitas vezes, não somos e não sabemos ser. Perguntamo-nos porque o sucesso, uma qualquer medida inefável e utópica de sucesso, não nos segue? Porque não nos sentimos feitos do mesmo material daqueles que fazem aquilo que queremos fazer?
Como desejamos coisas que não somos e que não podemos ser? Como enganamos os outros levando-os a pensar que sabemos o que queremos ou quem somos sequer. Onde está o sentido em tudo isto?
Encontrei uma espécie de resposta num podcast que costumo seguir de Chase Jarvis. E, sobre isto, sugiro ouvir um podcast muito especial “Seth Godin: What it means to matter“
A escrita é uma espécie de terapia. Um exercício do ego. Algo que coloca perguntas e procura respostas. Como sabemos onde está essa paixão se, na nossa lista de coisas que somos, Escritor não é a primeira que aparece?
Queremos resultados e garantias. Mas, não há garantias na criatividade . Não há garantias em nada. Há formas de estar e de ser. Há atitudes e hábitos que nos garantem um fluxo, muito real, na direcção geral daquilo que gostamos de fazer.
Neste mundo tão cheio de aparências, e de exigências pouco reais, resta-nos perder o medo e continuar. É no fim da nossa zona de conforto que começa a do medo e, é no fim desta, que começa o crescimento pessoal.
“Basta” arranjar coragem para entrar na última zona e, vermos por nós próprios, se o que dizíamos que queríamos ser nas nossas artes é real.
Quando pensam na pessoa que são em que lugar aparece ‘Escritor’ na vossa lista?
[cryptothanks]