Quando começa uma história?
Para o leitor, começa na primeira frase, no primeiro parágrafo, no primeiro capítulo.
Para o escritor começa muito antes, ou muito depois, disso.
Muito antes porque começa no delinear da história, na construção das personagens, nos apontamentos efectuados, nos excertos anotados. Começa no reunir de material que suporte a nossa escrita. No gerar, organizar e usar as ideias que temos.
Muito depois porque, muitas vezes senão todas as vezes, a nossa história começa numa outra frase qualquer lá para o início, meio ou fim do livro.
A frase inicial, não sendo a primeira frase a ser escrita, deve ser encarada como a mais importante. Uma primeira frase inesquecível é um instrumento poderoso. É uma anzol que só pode ser criado em consciência após completarmos a obra ou que deve, pelo menos, ser polida no fim do processo criativo.
A uma primeira frase inesquecível deve seguir-se um primeiro capítulo notável. Este é um início onde apresentamos o nosso mundo ficcional ao leitor, apresentamos personagens, colocamos a história em movimento, atraindo o leitor para aquele universo particular.
Actualmente, firma-se uma época em que os novos autores procuram afastar-se das regras que seguiam os Clássicos, e libertarem-se da tradição de iniciar/terminar uma história de certa maneira. Penso que procuram, também, libertar a literatura do estigma de ser aborrecida… porque muitos consideram os Clássicos aborrecidos e preferem formas mais leves de criar, e vender, uma história.
Sob esta perspectiva existem uma série de cuidados a ter com a forma como escolhemos iniciar a nossa obra. Estes são considerados verdadeiros “erros” a evitar se queremos agarrar o leitor logo ao início.
Mas, há muitas formas de se iniciar uma história. Algumas reconhecemos como inícios a evitar nos dias de hoje. Outras são dignas de explorar um pouco mais e trazê-las para a modernidade. E, outras ainda, são completos incentivos à nossa imaginação como escritores.
Assim, estas são as formas de iniciar uma história:
1. Uma história pode começar a meio de uma conversa
Não há nada melhor do que um Diálogo para podermos Mostrar algumas coisas, que não conseguiríamos introduzir com mestria, sem as Contar. Pessoalmente, sou fã desta abordagem inicial.
2. Uma história pode começar com a descrição de uma paisagem ou local que será a localização primária da acção
Eu sei! Esta frase remete-nos, automaticamente, para as descrições chatas de paisagens bucólicas que nos relembram momentos de luta intensa contra o sono. Não tem de ser este o caso.
A arte está em saber escrever, e manter o interesse do leitor, enquanto se apresenta o local que nos irá servir de cenário para partes importantes da acção.
3. Uma história pode começar com uma introdução do próprio narrador
Apresentar-se como o narrador da sua própria história, e fornecer detalhes mais, ou menos, pertinentes para o desenrolar da história, é uma abordagem directa que, por vezes, funciona muito bem.
Mais uma vez, não se pretende que o narrador embarque numa viagem autobiográfica, ou narcisística, onde nos Conta tudo o que quer mas, de excertos curiosos, ou com piada, ou mesmo crípticos que enredem o leitor desde a primeira frase.
4. Uma história pode começar com uma reflexão filosófica
Este é território muito controverso pois tende a ser a primeira escolha do escritor iniciante. Os filósofos tendem a ser pessoas de idade, com muitos anos de estudo, e muito espírito crítico. Os escritores veteranos têm muitos anos, leituras e obras escritas, de treino que suportam alguns dos inícios mais bem conseguidos da literatura.
Se não se enquadram nestas categorias de seres humanos, evitem estes inícios como se fugissem da Peste. Começar com um cliché ou uma ideia que não compreendemos na totalidade é, sempre, um mau princípio.
5. Uma história pode começar colocando a personagem principal em grande perigo
Atirá-la logo para um acontecimento mortal, ou brutal, que nos faça seguir com atenção o desenrolar do desafio lançado.
A forma como a personagem se desenvencilha dir-nos-á mais sobre si, e sobre a história, do que qualquer outra cena.
6. Uma história pode começar com um enquadramento que explica como a história principal se revela
Uma cena que leva ao desenrolar da história principal como, por exemplo, no decorrer de uma festa acontece algo que se torna no enredo primário, ou incluir como cena uma descrição de algo para uma audiência ficcional, que informa o leitor do que se passa.
7. Uma história pode, numa abordagem muito pessoal e criativa, começar a meio de uma frase
A forma como esta se completa fica a cargo da vossa imaginação… Logo de seguida, mais à frente, no final. Mas, mais uma vez, é preciso cuidado com estas abordagens mais criativas. Por vezes, o que parece muito inovador é indicativo de desconhecimento de técnicas pré-existentes e formatos pouco cuidados.
Uma história pode começar quando, onde e como definirmos. O porquê do seu início, também, só ao autor diz respeito.
Mas, acima de tudo, importante é dar início à história.
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Gostei muitos das dicas!
Obrigada, espero que sejam úteis.
OBRIGADA! Todos muito válidos. Mas o que realmente foi mais valioso: UMA HISTÓRIA PODE COMEÇAR QUANDO, ONDE E COMO DEFINIRMOS.
ESTAVA COM DIFICULDADES PARA INICIAR MINHA HITÓRIA, POREM GRAÇAS A SUAS DICAS ALGUMAS IDEIAS VINHERAM A MINHA MENTE, MUITO OBRIGADO PELO SEU TRABALHO.
Obrigada, Samael.
muito bom
Muito bom as dicas perfeitas, eu já escrevi uma história e com essas dicas as minhas histórias ficaram melhores!
A primeira história que escrevi” a última grande querra”
Apreciei bastante a matéria sobre recursos do escritor, descreve dicas excelentes de como raciocinar para dar início a uma história que talvez já tenhamos em mente, valeu !!!
Obrigada, fico feliz por poder ajudar.
Parabéns pela brilhante iniciativa de partilhar os seus conhecimentos!
Esta muito a me ajudar!
Obrigada, Vergilina.
Tentei diversas vezes mas nunca ficava satisfeita. Acha que ir no aleatório da mais trabalho do que traçar um plano de escrita? Já tenho quase toda a historia pronta, quero dizer, sei tudo o que acontece, os segredos as reviravoltas as perdas e etc, mas não possuo a chamada linguagem literária. A forma que descrevo a história nunca sai como imagino, fica bruta se é que me entende. Poderia me ajudar com isso?
Olá, Luciana. Sei do que falas e parece-me que todos nós sofremos do mesmo. A ideia é praticar até a nossa escrita ser o que desejamos que seja. Apenas com um aperfeiçoamento constante, com uma prática constante, é que temos uma hipótese de melhorar. Estudar a obra dos que vieram antes de nós, do nossos contemporâneos, e praticar para que a nossa própria forma de escrever consiga emergir por entre tudo o que escrevemos. Ninguém nos empresta a “sua voz”, temos de encontrá-la por nós mesmos.
Boa sorte com os teus escritos e continua a praticar. Não estás sozinha nesta luta!
Queŕ escrever minha biografia, acontecimentos , fatos tristes como venci a depressão que foram 3, casamento abusivo, criar filhos sozinha, tive uma infância dura pobre ,e até os cinco anos o pai era um visitante no lar….
Quais as dicas que me sugere por favor? Gratidão eterna
Olá, Betinha. Escrever uma biografia envolve técnicas específicas, mas continua a ser um género que podemos escrever, e continuar a praticar, enquanto alinhamos a parte mais técnica. Sugiro que continues a escrever sobre esses momentos, da forma que te forem surgindo, e podes continuar a pesquisar o tema ‘Como escrever uma biografia’. Sei que há vários cursos e informação online sobre isso. Entretanto, este tema é uma sugestão interessante para um próximo artigo aqui no blog. Vou trabalhar no assunto.
Obrigada pelo comentário, muita sorte para o teu projecto e bom trabalho.
Boa tarde, quero escrever a história da trajetória conturbada de 13 anos até conseguir engravidar e ter meu filho. Mas não sei como começar.
Foi uma trajetória duríssima e cheia de acontecimentos tristes e outros não.
Gostaria de orientações.
Olá, Cláudia. A orientação que me parece mais adequada é faz um primeiro rascunho. Não te preocupes com formato, com estilo, com nada, excepto colocar a história no “papel”. Quando estiveres preparada, começarás a procurar uma forma de escrever um segundo rascunho. Depois de teres a ideia no papel vais ver que é mais fácil procurar a melhor forma (para ti) de começar.
Até breve!