Acho que todos nós, de tempos a tempos, nos sentimos desiludidos com a vida que escolhemos. O tempo que empregámos, numa determinada arte, persegue-nos como se aquelas horas fossem feitas de ressentimentos que não podemos evitar.
Por vezes, estes bloqueios arrastam-se durante dias, meses ou anos.
E, se não chegamos mesmo a abandonar a nossa arte por completo, relegamo-la para um local de difícil acesso.
Outras vezes, desistimos.
Noutras, continuamos à procura da peça que nos falta. Aquela que acreditamos que nos falta. Aquela que existe em nós mas que nos recusamos a reconhecer, que preferimos ignorar, pois o sacrifício de fazer o que a arte exige seria doloroso de empreender.
Após estes períodos de confusão e neste caminho de volta à escrita, se estivermos atentos, acabamos por concluir que o único obstáculo à produção da nossa arte somos nós mesmos Share on X. Nós somos os nossos principais sabotadores. Em busca do desbloqueio, à prova de nós próprios, descobrimos que ele não existe. É fruto da nossa imaginação que seria bem melhor empregue a estudar e a escrever.
E, tal como me propus, há uns anos atrás, a partilhar convosco este meu caminho, estas dificuldades fazem parte dele. Do meu e, suponho, do vosso.
Não é que não tenhamos vontade de escrever. Aliás, noto que se passar muito tempo sem escrever vou acumulando pressão até esta se tornar demasiado para suportar. À laia de panela, mas cujo conteúdo não acaba cozido e, sim, espalhado por todo o lado.
A questão nunca é «Vontade» ou «Falta dela».
A questão é:
Do que estamos dispostos a abdicar para libertarmos tempo para a nossa arte? Share on XJá se sabia que tempos em que a vida avança de outras formas deixa pouco espaço para os nossos interesses pessoais. Agradecia algum espaço até para as actividades diárias ditas banais. Não funciona desta forma.
A vida nunca funciona desta forma. Avança-se e regride-se. Progride-se ou fica-se estático. Vive-se e faz-se o melhor que se pode com aquilo que se tem.
Acumula-se cansaço. Roubam-se minutos ao dia. Deseja-se mais, tendo cada vez menos. Por fim, a pressão acumula e a válvula dispara. E, por uns momentos, a nossa panelinha começa a cozinhar.
Tal como aquele vídeo mostra a cozedura da batata, do ovo e dos grãos de café, no fim o que importa é como saímos da pressão da água fervente. Quando se tira a tampa da panelinha e que observa o que saíu de lá.
Importa no que nos transformámos quando sujeitos à pressão. No que somos depois da pressão se esvair. Como lutámos pelo nosso sonho, mesmo quando não sabíamos como o fazer, ou porque o fazer.
É tudo muito bonito mas, é noite feita. Ainda não jantei. Ela dorme. Roubo instantes preciosos para escrever. E, assim vai a vida daquela que escreve e que se recusa a deixar de viver e de Ser.
Amanhã que seja, pelo menos, igual. Ou, se possível, melhor. Share on XQuantas vezes estiveste aqui? Neste mesmo local? Quantas vezes desististe para regressares amanhã?
::::::::::::::::::::::::::
“… continuamos à procura da peça que nos falta. Aquela que acreditamos que nos falta. Aquela que existe em nós mas que nos recusamos a reconhecer, que preferimos ignorar …”
“Nós somos os nossos principais sabotadores. Em busca do desbloqueio, à prova de nós próprios, descobrimos que ele não existe. É fruto da nossa imaginação …”
Faço minhas as tuas palavras, Sara.
É exactamente isso que eu sinto, a nossa sensação de carência e solidão é ilusória e provém da nossa mente, uma excelente ferramenta, mas simultâneamente o maior obstáculo à nossa liberdade e à realização do nosso Ser.
Olhamos para dentro, olhamos para fora e percebemos claramente e dolorosamente esta enfermidade que nos assola, enquanto seres humanos.
“Para onde havemos nós de ir,
nós que vagueamos neste deserto à procura da nossa identidade”
Só nos resta atravessar este deserto procurando a Paz que habita em nós …
Fica bem,
Bj.
Obrigada, Rogério. Sim, parece que a ideia é não desistir 🙂