‘É papel do autor definir quem será o narrador ou qual a melhor perspectiva para contar determinada história. É o autor que cria o universo onde a acção tem lugar e é ele que define qual o ponto de vista ou perspectiva sob o qual a história será contada.’ Recursos do Escritor: Qual é o teu ponto de vista? A narrativa na 1.ª pessoa
6. Terceira Pessoa Omnisciente:
O narrador omnisciente sabe tudo sobre todas as personagens, em todas as circunstâncias, mas não pode fornecer esse conhecimento à personagem que não o detém. Usa o pronome “Ele/Ela” ou, no plural, “Eles/Elas”.
Uma vantagem é assegurar a veracidade do enredo, uma vez que a informação é fornecida por um narrador que tudo sabe. Outra vantagem é tornar-se num tipo de narração apropriado para universos literários complexos com múltiplas personagens e sub-enredos.
A desvantagem é a dificuldade do leitor se identificar com as personagens da história, pelo afastamento do narrador, pela complexidade da história e pela multiplicidade de personagens.
Alguns excertos de obras escritas em 3ª Pessoa Omnisciente:
‘Sir Walter Elliot, do Solar de Kellynch, em Somersershire, era um homem que, para se distrair, nunca pegava num livro, com excepção dos Anais dos Baronetes: aí encontrava ocupação para as horas de ócio e consolação para as angustiadas; aí sentia a crescente admiração e respeito, ao contemplar o pouco que restava dos primeiros títulos nobiliárquicos; aí qualquer sensação desagradável, causada por assuntos de natureza doméstica, transformavam-se naturalmente em pena e desdém. (…)
(…)Ele era, nessa altura, um jovem bastante notável, inteligente, espirituoso e brilhante; e Anne era uma rapariga extremamente bonita, gentil, modesta, com bom gosto e bons sentimentos. Metade da atracção que cada uma das partes sentira teria bastado, pois ele não tinha nada que fazer, e ela não tinha praticamente ninguém para amar; mas o encontro de tais prodigiosas qualidades não podia falhar. Conheceram-se aos poucos, e depois, apaixonaram-se rápida e profundamente.’ ‘Persuasion’ de Jane Austen (tradução livre por Sara Farinha)
‘As pessoas esperavam a chegada do barco sem outras esperanças além da de verem renovadas as suas provisões de sal, gás, cerveja e aguardente, mas recebiam o dentista com alívio, sobretudo os sobreviventes da malária, cansados de cuspir restos de dentadura e desejosos de ter a boca limpa de lascas, para experimentar uma das próteses arrumadas em cima de um pano arroxeado de indiscutível aspecto cardinalício.(…)
(…) António José Bolívar sabia ler, mas não escrever. O mais que conseguia era garatujar o nome quando tinha que assinar qualquer papel oficial, por exemplo, na época das eleições mas, como tais acontecimentos ocorriam muito esporadicamente, já quase se tinha esquecido. Lia lentamente, juntando as sílabas, murmurando-as a meia voz como se as saboreasse, e quando tinha a palavra inteira dominada, repetia-a de uma só vez. Depois fazia o mesmo com a frase completa, e dessa maneira se apropriava dos sentimentos e ideias plasmados nas páginas.’ ‘O Velho que lia romances de amor’ de Luis Sepúlveda
‘A senhorita Brooke tinha aquele tipo de beleza que parece aliviar-se na má vestimenta. A sua mão e pulso eram tão finamente formadas que ela podia usar mangas tão desprovidas de estilo como aquelas com que os pintores italianos desenhavam na Virgem Abençoada ; e o seu perfil, assim como a sua estatura e presença, pareciam beneficiar do aspecto digno que as suas roupas simples lhe conferiam (…)
O senhor James Chettam ia jantar no Granje to-day com outro cavalheiro que as raparigas nunca tinham visto, e sobre o qual Dorothea sentia alguma expectativa veneradora. Este era o Reverendo Edward Casaubon, reconhecido em todo o conselho como um homem de conhecimentos profundos, justificado pelos muitos anos em que se envolvera em importantes trabalhos relacionados com a história da religião; era também conhecido pela sua riqueza que fazia brilhar a sua sincera religiosidade, e por ter ideias próprias, que estavam à beira de serem apuradas com a publicação do seu livro.’ ‘Middlemarch’ de George Eliot (tradução livre por Sara Farinha)
Este é um tipo de narrador que tem vantagens óbvias. Contudo o seu uso deve ser feito após ponderação de todas as características que queremos na nossa história.
Agora, que já passámos pelos 6 tipos de narrador, convido-vos a reflectir um pouco nas vantagens e desvantagens de cada tipo. Na descoberta do ponto de vista perfeito para cada história, cabe-nos a nós escritores ponderar sobre qual a perspectiva que mais a beneficia.
Usam a 3ª Pessoa Omnisciente? Ou preferem um narrador com um menor Complexo de Deus?
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