As nossas melhores ideias surgem quando nāo estamos debruçados sobre elas. Aqueles momentos em que, nos libertamos da (chata) vozinha interior, e permitimos que o que somos transpareça sobre a forma como vemos o mundo.
Uma delas atingiu-me tipo metropolitano (curioso é que era onde eu estava nesse momento) e deixou-me cheia de novos argumentos.
O Escritor é um mentiroso.
A sério.
Nāo é suposto escrevermos apenas verdades. Criar é fantasiar. Fantasiar é arranjar situações alternativas à realidade que conhecemos. Tudo o que nāo aconteceu na realidade é uma mentira… Estāo a ver onde quero chegar?
Isto significa que podemos usar aspectos que sāo reais, mas que nāo aconteceram connosco, de verdade. Podemos ficcionar coisas que nunca poderiam acontecer. Podemos mentir, porque o que interessa é a consistência que a nossa história tem, e nāo se aconteceu ou nāo.
Durante muito tempo debati-me com esta dicotomia. Nāo queria escrever verdades pois elas eram a minha realidade privada. Nāo podia escrever mentiras pois tudo o que nāo era real nāo tinha qualquer valor.
Há uns dias, no metropolitano fui agredida por algo, e nāo, nāo foi só por uma mochila gigante… fui atingida pela possibilidade de poder escrever sobre o que nāo existe, o que nāo é real… mentiras.
Perguntem lá: escrevo ficçāo há mais de duas décadas e só agora me ocorreu?Sim. De certa forma, sim.
Mentir é algo que nos ensinam ser errado. A mim ensinaram-no. Por isso, havia sempre um conflito entre as diferentes coisas que acreditava poder escrever.
Mesmo que sempre tenha optado por Ficçāo, Fantasia, Ficçāo Científica e Horror. Todos estes géneros eram, para mim, fantasia. Nāo eram mentiras.
Mas, sabem uma coisa?
Há tanta verdade nas mentiras que contamos. Share on XNāo sāo Realidades. Nāo aconteceram e, em muitas delas, dizem as leis da Física que nunca poderiam acontecer. Mas podem ser Verdades.
Ideias, conceitos, preconceitos, coisas que existem. Mesmo se nunca aconteceram sob aquela forma que escolhemos para as contar.
Agora, testem lá esta ideia. Experimentem sentar-se a Escrever e partam do princípio: O Escritor é um mentiroso e eu autorizo-me a mentir.
E, nāo faz mal. Devemos deixar-nos mentir à vontade.
Autorizamo-nos a escrever o que nos vier à cabeça, virando costas à vozinha moralista (ou merdalista) que nos impede de perseguir as ideias de maior potencial.
Se Escrever é ser-se Criativo, qualquer moralidade impingida afecta o resultado final.
Se nāo nos autorizamos a ser quem somos, e a escrever o que queremos, como podemos escrever algo com valor? Se nāo mentimos, como experienciamos as verdades? Se damos força aos preconceitos que temos como experimentamos ideias novas?
Nāo sei.
Sei que, desde que descobri esta moralistazinha embirrante, que tenho testado a teoria. Escrever é mentir.
Se sāo nas mentiras que recusamos dizer que transparece a verdade, o que encontraremos se perdermos o medo de Mentir?
O que achas?
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Boa tarde, Sara Farinha.
Desde que descobri o seu blog, tenho acompanhado você e seus escritos maravilhosos.
Sou um fã, quero, antes de qualquer coisa, que saiba disso.
Nas linhas que traço e crio uma ou muitas mentiras, jamais pensei por esse ângulo. Talvez faltou me sensibilidade, ou consciência da mentira que me acompanha quando escrevo.
Mas, agora que sei desse ato, me permito ir mais a frente.
Quero também aprender com você, tenho tentado colocar em prática, alguns dos seus ensinamentos.
Muito obrigado.
Abraços fraternos.
Mario Deggas.
Olá Mário, obrigada pelas suas palavras. Não imagina como é bom saber que do outro lado do ecrã existem pessoas que se identificam com o que escrevo e que usam o seu tempo para me deixar comentários como o seu. Muito obrigada e espero que continue a encontrar valor nas palavras que escrevo e a deixar comentários.
Obrigada.
Nao. Nao penso que o escritor é um mentiroso. Ele é um criador, mesmo que conte alguma verdade, nao passará de uma ficção. Verdade ou invençao trata-se de pura ficção.
Olá Conceição,
Há tantos aspectos deste argumento. Acho que o artigo é bastante explanatório 🙂 Escrevemos Ficção sempre.